segunda-feira, 12 de janeiro de 2004

Me surpreendeu que o Théo falasse de morte, porque ele não teve ainda nenhuma experiência próxima com a morte. Eu não sei como pode ter nascido nele esse medo, essa consciência. Eu não sei como ou quando isso surge. O Théo quer seus cinco anos de idade por mais tempo. E sempre, de algum jeito, me dói a passagem de tudo. Eu não sei como ou quando me nasceu esse medo.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2004

Uma conversa que tive na semana passada com o Théo, meu sobrinho de cinco anos, foi o que me fez criar este blog. A vontade de escrever sobre a conversa. Ou, talvez, de simplesmente tentar reproduzi-la. Estávamos em Vila Velha - na casa onde morei desde que nasci até os 17 anos de idade - deitados na cama. Não me lembro se tínhamos acabado de acordar. Acho que não, me parece agora que era o meio da tarde, mais ou menos. Talvez a gente estivesse descansando um pouco depois de jogar bola na sala de casa por algum tempo. Com o calor forte que estava fazendo na semana passada, em Vila Velha, devíamos estar exaustos (eu, principalmente, que me canso muito antes do Théo). Isso aconteceu algumas vezes naquela semana: ele insistiu para que jogássemos bola, eu aceitei para alegrá-lo, jogamos por um tempo, eu me cansei e propus que descansássemos um pouco. Não sei se no momento dessa conversa era isso o que tinha acontecido. Nem sei mais o dia exato em que a conversa se deu. Talvez terça-feira, dia 23 de dezembro. Talvez quarta, já, dia 24. O fato é que, quando ela aconteceu, estávamos no quarto que um dia foi do meu pai e da minha mãe, depois foi só do meu pai, depois foi da minha irmã, depois foi da minha irmã e do Théo (dentro do berço), depois foi só da minha irmã de novo e agora não é de ninguém, mas ainda tem um sofá-cama onde eu e o Théo nos instalamos na semana passada (quando estivemos em Vila Velha para, entre outras coisas, passar o Natal). Estávamos deitados na cama. Pode ser que eu estivesse tentando convencê-lo a tomar banho. E eu não sei sobre o que estávamos falando, mas acho que a frase do Théo não tinha a ver com nada do que havia sido dito antes: "Eu não quero fazer seis anos". Fazer seis anos não deveria ser uma preocupação para ele agora, já que seu aniversário é só em outubro. "Por quê?" "Porque eu quero ficar criança para sempre. Eu vou ficar pra sempre com cinco anos." "Ah, é? Por quê?" "Porque eu não quero morrer". Eu tenho muita raiva da minha memória sempre imprecisa. Maria Eugênia descreve a roupa que estava usando no seu aniversário de, sei lá, sete anos, e eu não consigo lembrar direito o que exatamente o Théo me falou uma semana e meia atrás. Eu queria muito reproduzir aqui o que foi dito naquele dia em Vila Velha, mas o que surge é uma tentativa bastante frágil de lembrança. Não sei se eu falei alguma coisa depois que ele me disse aquilo, mas meus olhos se encheram d'água. Tentei disfarçar, não quis que ele me visse chorando pra não deixar tudo mais pesado. Ele me perguntou se todas as coisas morriam, e eu disse que sim. "Mas eu não vou morrer", ele voltou a afirmar, pelo que me lembro. Então ele perguntou se um shampoo morria, acho, e aí eu disse que não, que a coisa tinha que estar viva para morrer, e que um shampoo não estava vivo.