Motor
Vou acabar machucando minha boca você diz
seus lábios estão ressecados pelo frio
seus dentes encontram as pontas de pele
para arrancá-las
Antes que se pense a respeito
os dentes lá estão
E mesmo que se pense a respeito
os dentes lá estão
Há pouco você evitou um outro gesto irrefletido
quando sua mão e seu fôlego
estavam prontos a acender um cigarro
Sem um maço
e sem fogo
no bolso
o gesto não se completa
e ainda que o sabor da fumaça não mais o mova
por um instante a mão e o fôlego
são no seu corpo algo que falta
trata-se de um buraco
a morte difícil de um hábito
Meus lábios também se partem no frio
e também os mastigo
Não precisa esperar comigo você diz
passar frio à toa
o ônibus vem logo
ou demora pouco
posso esperar sozinho
Eu sorrio
não sei dizer nada
não saio daqui
necessito
(como sua mão de um cigarro que se tire do maço
e se prenda entre os dedos)
ver você entrar no ônibus olhar ao redor sentar-se
ver você
ainda
enquanto desaparece
4 Comments:
Que bom que você esteja de volta, Caetano. E com um poema tão rigoroso e tão bom
Caetano... que lindo...
bjos
Natacha
não li a matéria do mondrian, mas ver os bovinos reencontrados foi uma coisa que animou a manhã e eu resolvi marcar aquilo de alguma forma. pobre do tio, que ficou sem esse crédito. haha, você agora é o bonequinho narigudo? :^)
caetaninho... que saudade de tu e de encontro ao acaso no ônibus que me dá.
lindo, lindo poema.
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