sábado, 31 de julho de 2010

Sylvia Plath em Madri (1932 - 1963)

7 de julho de mil novecentos
e cinqüenta e seis. Ted Hughes e Sylvia Plath ainda dormem.
É uma noite quente.

....................................O céu
põe em sua pele pequenas mãos azuis.

....................................................................E ela,
longe dali,
vê um bosque,
 

............................ouve as árvores que agitam
a luz

...............e o vento feito de leões vazios.

Depois
 

..................abre os olhos,
vai à varanda
olha algo que há neste perfeito
escuro de verão,
algo que pertence à dor que a espera,
o inverno de dentro de sete anos,

..........................................................a casa
número 123 de Fitzroy Road,
os dias
de chuva,

................a cidade
parada sob a água como um corpo
a que lentamente se acercam os cirurgiões.

Penso em tudo isso enquanto te escrevo outro poema;
enquanto digo:
Você é Patti Smith olhando para uma auto-estrada.
Eu sou o primeiro dia de Lorca em Nova Iorque
Você é Sylvia Plath sentada em um terraço.
Você é Robert Lowell sonhando com um rio.

Mas torno a parar.

....................................Fecho os olhos
e a imagino: observa
as ruas de Madri; ainda lhe falta
saber por quê, mas já sente o medo.
É estranho: ainda
são felizes e jovens,
 

................................esperam
aprender algo que ninguém lhes possa ensinar;
mas, de alguma forma, Sylvia já pode vê-lo,
ainda faltam sete anos,

.......................................mas já pode vê-lo:
Ted se foi. Está muito sozinha. E talvez pense: lute
por tudo o que lhe converta em quem você acha que é.

Mas o dia está muito frio.

.............................................E a chuva golpeia
a velha casa onde viveu Yeats; onde ela
passa o inverno de mil novecentos
e sessenta e três, o mais terrível dos últimos
15 anos. Está sozinha. Ainda não tem
calefação, a luz se vai, o telefone
não funciona.

.......................E um dia
escreve: “Sou eu mesma. Não é o bastante.”
E outro dia, volta a olhar a neve
sobre Fitzroy Road;
 

..................................abre o gás, 
........................................................escuta
grandes árvores que parecem homens perdidos.

Agora, volto a pensar em você e em mim;
me pergunto
que parte de nós se parece com essa história;
me pergunto

.....................se deveria começar
meu poema: eu sou Ted Hughes queimando
os diários de Sylvia Plath.

...........................................Depois
espero até que tudo volte a ocupar seu lugar,
se refaça,
se feche
muito lentamente, como a água de um rio
atrás de um nadador.
 

.......................................E logo penso:
— Este poema é Sylvia Plath da mesma forma
que chamamos de vento a uma árvore que se move.
Mas escrevo:
Eu sou você e eu correndo pelas ruas de Londres.
Você é Virgínia Woolf em uma casa vazia.

(Benjamín Prado - tradução de Marília Garcia)